Me enviaron este email y no pude hacer otra cosa, que compartirlo con ustedes, publicándolo, esta en portugues, para que practiquemos la union americana. No comparte necesariamente la opinión de autor de este texto.
Punk, Veganismo e Agnosticismo – coisas separadas ou idéias complementares?
Por Alice
Primeiramente, me ocuparei de tentar elucidar a motivação de tal texto. Logo no título, ele já deve causar algum choque e controvérsias; como associar Punk (que é um movimento social), Veganismo (que é uma filosofia de vida) e Agnosticismo (que é uma posição sobre o conhecimento, ou o não-conhecimento, do divino)? Para mim, que sou militante do movimento Punk, Vegan e Agnóstico, essas coisas parecem se encaixar perfeitamente; mas creio que essa visão não é sequer comum, que dirá universalmente conhecida. Portanto, resolvi escrever esse texto, mostrando que o lado social, o lado ético e o lado “espiritual” de uma pessoa podem existir em harmonia, sem a necessidade de falsas afirmativas e nem de verdades absolutas. Além disso, o texto também me será útil para esclarecer a outros a minha visão sobre o movimento Punk, o Veganismo e o Agnosticismo, o que certamente me poupará tempo e esforço de responder questões que, de alguma forma, unem dois ou mesmo os três aspectos citados. Já me aconteceu de, por exemplo, estar explicando o que acredito ser o movimento Punk, daí a conversa entrar em Veganismo e eu ter de defini-lo para então surgir a necessidade de esclarecer a minha posição agnóstica.
A começar pelo aspecto social, vou tentar aqui elucidar a minha visão sobre o movimento Punk e o que me faz declarar-me militante desse movimento. O movimento Punk é, por essência e por definição, um movimento libertário, ou seja, um movimento que busca a liberdade, ou sendo mais específico, que busca a liberdade do ser humano, seja ela física, mental, de expressão, de opinião, etc. Sempre fui uma pessoa muito afeiçoada à liberdade, desde criança sempre ataquei com “por quês” qualquer coisa que me obrigassem a fazer. A mim sempre foi estranha a idéia de se fazer aquilo que não se quer, independente do resultado disso. Por volta dos 15 anos, comecei a me interessar por assuntos relacionados à política (entenda-se bem que o termo usado foi política, não politicagem), e então comecei a militar na entidade estudantil secundarista de meu município; devo toda a minha base de formação política a esse período da minha vida. Lá, como já se faz costume em entidades estudantis, havia muito envolvimento de partidos políticos, cada qual buscando a entidade apenas como um meio de conquistar as suas próprias metas, independente do objetivo da entidade; assim sendo, pude ver e perceber o quão mesquinhas eram as disputas entre tais partidos. Eu que ia às reuniões para discutir, trocar idéias, organizar passeatas, etc. apenas via discussões vazias entre membros de partidos opostos, ataques pessoais que nada traziam de produtivo à discussão e uma clara disputa pelo controle da entidade. Então, logo no começo da minha militância, aprendi que partidos políticos não são uma boa coisa; porém, dialeticamente, a pessoa que mais contribuiu na minha formação política nesse período e que mais me foi sincero foi um dos membros mais devotos de um desses partidos. Com o passar do tempo e a expansão de minhas leituras, me afastei da entidade e comecei a militar por conta própria, indo em passeatas, fazendo panfletagem e organizando discussões onde achasse conveniente, sem me associar a qualquer tipo de grupo. Foi nessa época que conheci um amigo que é militante do movimento Punk, e com a nossa convivência, fui percebendo que as minhas práticas eram muito semelhantes às dele, mas ainda assim resisti a me “proclamar” punk. Só disse a mim mesmo que eu era punk quando procurei conhecer um pouco mais a fundo o movimento e pude perceber que não só as práticas, mas também a história do Punk era totalmente condizente com aquilo que eu acreditava; então pensei “ora, se sou libertário como um punk, ouço músicas de punks, milito com punks e me identifico com a história do Punk ... não me dizer punk nessas condições seria mais uma pirraça do que evitar rotulações!”. Mas essa “declaração” que fiz para mim mesmo, e também a quem perguntasse, não trouxe mudanças significativas, pois apenas continuei fazendo tudo o que já fazia, mas agora eu fazia parte de um movimento, deveria lutar pela coerência e existência dele. Então passei a ter uma posição mais ativa quanto a estudar o Punk; peguei livros sobre o assunto diretamente (ex.: “O que é Punk”), sobre coisas relacionadas (ex.: “Discurso sobre a origem das desigualdades entre os homens”) e em livros de História em geral, também usei a Internet como fonte de consulta e leitura, mas sempre adotando a posição de encarar os textos da Internet com cautela, sabendo que qualquer coisa pode ser escrita na Internet, havendo ou não compromisso com a verdade. Assim fui elaborando e depurando a minha visão sobre o movimento Punk que foi se tornando diferente da primeira que tive, e isso foi um fato extremamente positivo. Comecei a perceber que o punk não é apenas um drogado sujo, muitas das vezes ele não é nem um, nem outro; o punk é uma pessoa que percebeu que há algo de errado na organização da sociedade, percebeu que enquanto pessoas comem de tudo o que desejam, outras morrem de fome nas ruas, que enquanto uns trabalham toda a vida e mal conseguem se sustentar, outros ostentam sem nunca haver trabalhado. Mas somente essa percepção não torna ninguém um punk, pois acredito que somente a hipocrisia e inverdades são capazes de impedir essa percepção. Além de perceber isso, o punk revolta-se contra isso e sabe que a mudança só depende dele, sabe que se não for ele e não for agora, não será ninguém e não será nunca; por isso, o punk está disposto a dedicar a sua vida a combater aquilo que considera errado, injusto, cruel, decadente e pútrido, e o punk sabe que a raiz de todos os males atuais de nossa sociedade está na forma que ela está organizada, uma sociedade hierarquizada, onde o homem é dominado pelo homem, e sabendo disso, entende que a única forma de vivermos em um mundo melhor é acabando com essa organização social baseada em hierarquias e no dinheiro e construir uma nova sociedade, baseada na liberdade e na igualdade. Portanto, todas as posturas punks são desdobramentos desse entendimento. O movimento punk é um movimento minimalista, visceral, instintivo; minimalista no sentido que cada militante sabe que seu trabalho é parte essencial para a construção de um todo, visceral no sentido de que o punk liberta por suas atitudes e comportamento tudo aquilo que o sufoca e o faz morrer um pouco a cada dia, e instintivo pois o punk acredita que aquilo pelo que ele luta é instinto da raça humana, a liberdade seria um bem essencial na vida do homem, só alienável com algum consentimento, mesmo que ludibriado, e o punk jamais consentirá com a extinção da liberdade. Se o punk não se importa com suas vestimentas, ou melhor, usa um visual agressivo, é para mostrar que a pessoa não é definida pelo que possui, mas sim pelo seu conjunto único de características físicas e mentais; se o punk se declara contra as instituições, é porque sabe que a realidade é dinâmica e que nada dura para sempre; se o punk procura a arte underground, é porque sabe que a arte parte de cada um, não do dinheiro ou de grandes corporações. Há uma questão que gera muito debate entre os punks, mas que eu gostaria de deixar patente aqui a minha opinião sobre, que é a questão das drogas. O movimento Punk começou na Inglaterra dos anos 70, uma sociedade baseada na moral e nos bons costumes acima de tudo; como o objetivo do Punk é atacar a sociedade que considera errada, as atitudes dos punks da época eram totalmente coerentes com seus objetivos. Eles usavam drogas e saiam para fazer baderna nas ruas, bebiam até cair em pubs, ficavam pulando dentro de trens para chocar as pessoas, faziam shows barulhentos em locais públicos, ocupavam praças com seu visual agressivo, xingavam senhoras recatadas e defensoras do sistema, etc; nada melhor para atacar uma sociedade baseada na moral e nos bons costumes do que não ter moral e manter maus costumes, certo? Bom, hoje em dia, porém, nossa sociedade mudou de foco: não é mais uma sociedade baseada na moral e nos bons costumes, é uma sociedade baseada na exploração e na ganância. Pois bem, sabemos que as drogas (todas elas) atendem aos interesses dos poderosos em, pelo menos, duas vias, movimentando a economia e funcionando como válvula de escape para as pessoas, que ao invés de enfrentarem o patrão por melhores salários, enchem a cara no bar. Então, nos dias de hoje, as drogas só contribuem com a lógica do sistema, fazendo-o crescer e se fortalecer. Nesse caso, se o punk é contra o sistema, terá, acredito, que ser também contra as drogas; beber nas ruas não choca mais ninguém e usar drogas não é mais sinal de rebeldia, mas sim sinal de fraqueza. Então o punk que bebe todo dia, achando que está contrariando a lógica do sistema, sendo rebelde e fazendo o que ele quer, na verdade está colaborando com o sistema, sendo manipulado e, logicamente, não sendo punk. Muitos, sem argumento algum, insistirão em dizer “eu bebo porque quero, ninguém me obriga a isso, quando bebo fico chato e o sistema não quer chatos, quer engomadinhos”; para esses, eu apenas digo que quanto mais ele bebe, mais ele ajuda a indústria do álcool a crescer, algumas empresas de bebidas alcoólicas são multinacionais, então qual seria a diferença entre o Mc’Donalds e uma empresa dessas? Bebida pode, comida não? Não creio que alguém comprometido com a mudança da sociedade e disposto a viver por isso tenha argumentos para defender o consumo de drogas; as legalizadas fortalecem o ramo industrial, explorando milhares de empregados, as ilegais fortalecem o tráfico, aumentando a violência e, por conseqüência, aumentando a repressão do estado sobre nós mesmos, membros das classes menos abastadas. Na verdade, até alguém sem nenhum comprometimento com mudança social mas que esteja certo que não deseja causar mal a outras pessoas também não terá argumentos sólidos para defender o uso de drogas. Vou dar dois exemplos clássicos e bem simples do que estou falando:
1) Imagine que você, para fazer uma festa, comprou um engradado de cerveja, que custou 20 reais. Desse dinheiro foram repassados 10 reais ao fabricante, que o usou na expansão de seu comércio, que passou a abranger o bairro X, onde nunca havia chegado bebida alcoólica. Um pai de família do bairro X foi despedido do emprego na mercearia que trabalhava e resolve encher a cara no bar a caminho de casa. Chegou em casa bêbado, espancou a mulher e estuprou a filha de sete anos, tudo isso com a ajuda do SEU dinheiro;
2) Você vai ao morro e compra 20 reais de cocaína, o vendedor usa o dinheiro para comprar uma arma, meses depois ele assalta sua mãe, ela reage, e o assaltante, nervoso, mata sua mãe com a arma que comprou com SEU dinheiro.
Muitas pessoas refutam esses exemplos com argumentações do tipo “não é minha culpa, cada um faz o que quer, eu não espanquei a mulher do cara e estuprei sua filha ou matei a mãe de ninguém”; e se você pudesse, somente conversando, convencer o cara do primeiro exemplo a não beber e ele chegasse em casa, beijasse sua mulher e contasse uma historinha para sua filha, você conversaria com ele? E se minutos antes do assaltante do segundo exemplo matar sua mãe você pudesse denunciá-lo à polícia, você o faria? Duvido que muitas pessoas possam ser sinceras ao responder essas perguntas com um “não”, mas mesmo respondendo afirmativamente seria difícil estar “no local certo, na hora certa”, então você ainda acha que não pode fazer nada, não é? Mas você pode, se a pessoa dos exemplos nunca tivesse usado drogas, nada daquilo teria acontecido. Muitos alegarão que isso pode ser um prazer, e que ninguém deve renunciar a um prazer para agradar, ou mesmo preservar, outros. Mas será que isso é realmente certo, trocar um prazer por uma sociedade melhor? E, diga-se de passagem, as drogas são um prazer autodestrutivo, então há outras opções muito melhores.
Visto tudo isso, como pode o punk usar drogas, se batalha por uma sociedade justa e igualitária? Eu acredito que a luta do punk deve se dar em todos os setores da sua vida, não dá pra ser punk nisso e não ser naquilo, ser punk é assumir um compromisso consigo mesmo, e acredito que seja uma das piores coisas do mundo mentir para si mesmo. Queria, antes de mudar de assunto, deixar claro aqui que não sou Straight Edge (para quem não conhece, é um grupo que não usa drogas e é adepto do amor fiel, sendo contra a prostituição, e eles se identificam com um “X” na mão, ou ainda colocando um “X” antes e depois de seu nome), pois quando vim a saber o que era o Straight Edge já me posicionava contra o uso de drogas. Outra coisa que eu gostaria de esclarecer sobre o movimento Punk é a confusão que existe entre Punk e Punk Rock. Muitos punks ouvem exclusivamente a combinação punk/hardcore, e na maioria das bandas punks se encontram letras de protesto e ativismo; ora, então, isso é muito positivo para o punk, pois ajuda ele a manter seu ideal de pé sempre, além de mostrar que a música também pode servir pra veicular suas idéias, não apenas divertir e entreter. Disso resulta que muitas pessoas, e até mesmo os próprios punks, pensam que o punk tem que ouvir música punk, outros chegam mais longe, afirmando que o punk deve ouvir apenas música punk. Na minha opinião, as duas coisas são inverdades. O movimento Punk nasceu após a invenção do Punk Rock, ou música punk, não o contrário, e acredito que mesmo que a música punk tivesse nascido depois do movimento, não haveria necessidade de a militância ouvir o som punk. Lógico que pertencer a um movimento significa abraçar e incorporar a sua história, mas também não significa criar determinantes, muito menos no caso de um movimento libertário, como é o caso do movimento Punk. Dizer que para uma pessoa ser punk ela tem que ouvir música punk é um absurdo; se, por exemplo, uma menina adota o visual agressivo e simplista do punk, com um belo moicano e roupas baratas, faz protestos sempre, faz panfletagem, é libertária, luta pela extinção do sistema atual e sua substituição por uma sociedade justa e igualitária e gosta apenas de música folclórica, fazendo inclusive parte de uma banda underground, o que há de incoerente se essa menina se declara punk? Eu, sinceramente, não vejo nada de incoerente ou de errado nisso, e, sob pena de estar sendo parcial, não vejo como alguém pode apontar um erro nisso. Acho que é reduzir a abrangência do movimento dizer que alguém é ou não é punk pela música que não ouve (lógico que pode-se apontar estilos musicais opostos aos ideais punks, como, por exemplo, o “funk carioca”, que prega o uso de drogas, machismo, feminismo e segregação, fechando os negros e favelados no “seu espaço”, pois não podem conviver no mesmo espaço que a elite). Também temos que prestar atenção para não cometermos o erro oposto, ou seja, abrir o conceito de punk a qualquer pessoa que tenha ideais semelhantes ao Punk. No exemplo mesmo da música, se temos um dono de uma multinacional, que só veste roupas caríssimas simplesmente pela etiqueta, que explora cada vez mais seus funcionários, é de extrema-direita, ultraconservador e adora música Punk, principalmente as bandas mais undergrounds, podemos classificar essa pessoa como Punk? Eu afirmo que não; na verdade, nem precisamos extrapolar tanto, pode ser uma pessoa comodista que gosta de música Punk, e eu não o considerarei punk. Ser punk é ser libertário, sem dogmas ou fórmulas, é atacar de frente o sistema, dizer que não o deseja, que quer é ver sua desconstrução e substituição de uma sociedade libertária, justa e igualitária, e não acho que o tipo de música que uma pessoa ouve possa arruinar-lhe a convicção que deve possuir para abraçar o Punk em sua vida.
Como tentei mostrar, o Punk é um movimento social que busca a liberdade do ser humano, pois os punks entendem que o ser humano não existe para ser aprisionado ou hierarquizado. Mas, com o tempo e convivência com pessoas do movimento ou próximas a ele, ouvi falar superficialmente do Veganismo; sabia apenas que eram pessoas que não comiam nada que tivesse componentes de origem animal, tal como carne, leite, ovos e derivados. Eu até brincava com isso, dizendo que eu nunca ia conseguir deixar de comer um X-tudo; mas a curiosidade cresce, e um colega que também brincava assim leu umas coisas na Internet sobre o Veganismo, e quando ele me falou, comecei a pensar melhor, e eu mesmo resolvi procurar sobre o assunto na Internet. Os textos que li eram daquele tipo que choca você, falando de quanto sofrem os animais que são abatidos, que a carne é um luxo, pois atualmente podemos substituí-la por proteína de soja, que proteína de soja é mais barata que carne, que a indústria da carne usa 2/3 da produção mundial de grãos, o que daria para acabar com a fome no mundo, o quanto é cruel o processo de retirar peles de animais, as maldades que são feitas com seres que sentem dor, medo e angústia em nome da ciência, etc. Fiquei impressionado, nunca havia lido, visto ou ouvido coisas semelhantes, achava que os vegetarianos que existiam no mundo eram motivados por ter uma vida saudável; foi através desses textos também que descobri que o Veganismo não se limitava apenas à alimentação, mas se fazia em nome da libertação animal. Cortei os produtos de origem animal da minha dieta logo após isso, e foi muito complicado. Quando fui à casa do meu pai e dei a notícia, ele falou que isso era errado, que o homem só tinha evoluído, pois comeu carne e que se parássemos de consumi-la iríamos regredir, e prometeu me mostrar um texto sobre isso. O texto que ele me apresentou foi uma matéria da revista superinteressante, escrito por Rodrigo Vergara; depois de ler o texto, eu sabia que nunca mais conseguiria comer carne, aquele texto deu razão e fundamentos para aquilo que eu vinha fazendo apenas pelo choque que tive pelas informações que vi, ou seja, foi através desse texto que passei a pesquisar mais e querer saber mais sobre o Veganismo, acho que se não o tivesse lido ou qualquer coisa semelhante, depois de uns três meses ia cair, não tinha o pilar ideológico necessário para manter a minha posição. Dali pra frente comecei a buscar mais fontes, e a primeira grande obra que vi sobre o tema foi do filósofo Peter Singer, o nome do livro é “Ética Prática”, é um livro excelente, pois trata de vários assuntos éticos de grande repercussão, como eutanásia, aborto, teste com células tronco embrionárias e, claro, testes em animais e se é eticamente defensável comê-los. O autor é muito conhecido no meio do Veganismo, pois foi após o lançamento dessa obra dele que surgiram as primeiras grandes entidades de combate à violência contra animais. Singer trabalha com uma gama enorme de argumentos, sempre apontando os rumos de várias correntes filosóficas e se aprofundando naquela que defende. Daí pra frente comecei a pesquisar cada vez mais, o Veganismo passou a fazer parte da minha vida, do meu cotidiano, das minhas preocupações. Hoje, vegan ha mais ou menos três anos, já tenho meus conceitos definidos (o que não significa estáticos ou imutáveis) sobre o Veganismo, não estou mais caminhando no escuro como no primeiro ano; foi, com certeza, uma escolha difícil, significou abandonar 17 anos de “cultura onívora”, sem me preocupar com os animais, mas como fiz convicto que o Veganismo é uma necessidade, não uma opção, nunca dei nenhum passo para trás e, sem falsa modéstia, me orgulho muito disso. Cada um tem o seu tempo e o seu ritmo, e eu conheço pessoas que demoraram mais para atingir o Veganismo, outras menos, mas eu nunca “caí” (gíria que usamos quando algum vegan come algo de origem animal, usa vestimenta de lã, couro, etc., usa produtos testados em animais, vai a espetáculos que usam animais, etc.) conscientemente, pois, claro, na nossa sociedade todo vegan ha algum tempo já caiu com coisas pequenas (corantes, produtos químicos, materiais que pensavam ser sintéticos, etc.); eu conheço vegans que já pararam durante um tempo, outros que foram vegans e hoje não são mais, pessoas que tentam, ovo-lactos, etc., cada um na sua.
Bom, mas o que é realmente o Veganismo? Vou tentar definir o que acredito ser o Veganismo, embora acredite que, no caso específico do Veganismo, não existam muitas divergências conceituais. Vegan ou vegano é aquela pessoa que adota a libertação animal como filosofia de vida; as motivações dos Vegans podem ser várias, mas a minha em particular, e a mais difundida pelo que sei, é a “igual consideração de interesses”. É sabido pela ciência que animais são capazes de sentir dor, tanto física quanto psicológica, na forma de medo e angústia; se animais podem sentir dor e não temos a necessidade de causá-la, por que continuar? Sadismo? O Veganismo, diferente do Punk, é uma filosofia de vida, não um movimento; além disso, gostaria de esclarecer que o Veganismo é uma escolha ética, portanto não se pode envolver coisas que não digam respeito única e exclusivamente à ética, como religião, sentimentos, etc. Existem vários tipos de vegetarianismos, o Veganismo é um deles, e vou tentar definir cada um aqui: Vegetariano (pessoa que não come carne, ovos, leite nem derivados, sua alimentação é exclusivamente vegetal); Ovo Vegetariano (pessoa que se alimenta de vegetais, ovos de animais e derivados); Lacto Vegetariano (pessoa que se alimenta de vegetais, leite animal e derivados); Ovo-Lacto Vegetariano (pessoa que se alimente de vegetais, leite animal e derivados, ovos animais e derivados); Frugívoro (pessoa que se alimenta exclusivamente de frutas); Crugívoro (pessoa que se alimenta exclusivamente de alimentos crus); Vegan (pessoa que adota a causa da libertação animal, não usa produtos testados em animais, peles, pelos e similares em vestimenta, não se alimenta de nada que contenha produtos de origem animal, boicota espetáculos com animais, enfim, abole tudo que explorar e fizer sofrer os animais). Normalmente, só o vegan tem, entre essas sete classificações, um motivo diferente de saúde para fazer a opção. Muitas pessoas rebatem com argumentos falsos as questões levantadas por vegans sobre a necessidade ou não do uso de animais na alimentação, vestuário e testes científicos; vou tentar agora mostrar os argumentos dos vegans, a forma mais comum como são rebatidos e porque essas respostas são inverídicas.
A primeira alegação que fazem é de que é impossível ao ser humano extrair dos vegetais as proteínas necessárias ao funcionamento do corpo humano, que só na carne animal isso é conseguido eficientemente, visto o tamanho diminuto de nosso estômago. Sem sombras de dúvidas o ser humano foi feito para comer carne, e nem preciso ir longe para afirmar isso, basta que observemos a boca do ser humano: temos 32 dentes, entre os quais são 8 incisivos, que servem para cortar (adequados para vegetais); 4 são caninos, que servem para rasgar (adequados para carne); e 20 são molares e pré-molares, que servem para esmagar e triturar (adequados para grãos). Portanto, a dieta ideal para o ser humano seria constituída de 2/8 de vegetais, 5/8 de grãos e 1/8 de carne! Isso já mostra que a carne não deveria ser tão consumida quanto o é em nossa sociedade. O corpo humano não necessita de “vegetais”, “grãos” ou “carne”, mas sim de “fibras”, “ferro” e “proteínas”, por exemplo; portanto, se substituirmos nossa alimentação por qualquer coisa que contenha os elementos que necessitamos, não há problemas. Também não posso discutir que a carne é a maior fonte de proteínas e que não podemos extrair as proteínas necessárias para nossa vida comendo vegetais, para isso uma simples comparação de nosso estômago e intestinos com os mesmo órgãos de animais herbívoros, percebe-se que nosso estômago é pequeno (para digerir pouca quantidade) e nossos intestinos grandes (para extrair os nutrientes e destruir o resto da comida), já os herbívoros possuem estômago grande (pois tem que comer muito) e intestino pequeno (como a comida é “leve”, o estômago faz o trabalho quase todo). A carne é quase 70% proteína, contra os menos de 20% de proteína contidos na soja, então teríamos que comer 3,5 vezes mais soja do que carne para viver. Porém, com a nossa moderna tecnologia, tira-se tudo da soja que não for a proteína (principalmente seu óleo, que é muito comercializado), e tem-se um alimento com quase 100% de proteína, conhecido como “Proteína de soja texturizada” ou “carne de soja”; uma pessoa que come carne tem que comer 1,5 vezes mais carne do que quem come proteína de soja. Vale ressaltar que a proteína de soja é mais barata que a carne, sendo assim, come-se carne por qualquer outro motivo, menos por necessidade. Na verdade, o consumo de carne é um fator cultural em nossa sociedade, não tem nada a ver com o fato de agradar ou não o paladar; para ficar mais claro, vou exemplificar. Uma pessoa que adora carne é chamada por um colega para experimentar um prato novo em sua casa, e vai. Durante a refeição, come bastante, pois o paladar lhe agrada, e, ao término, quando questionado, aprova e pergunta do que se trata, daí lhe respondem que era carne de um animal exótico, como por exemplo, pavão; certamente essa pessoa, sempre que puder, irá comer carne de pavão, pois lhe agradou o paladar. Mas se lhe informassem que, ao invés de carne de pavão fosse carne de cachorro, ou gato, ou cavalo, ou qualquer outra espécie de animal que em sua cultura não se come; certamente essa pessoa ficaria chocada e, mesmo tendo outras oportunidades, não comeria mais dessa carne. Ou, indo mais longe, se lhe dissessem que era carne de um recém nascido, tratada em laboratório para não causar mal algum (coloco nesses termos pois alguns rebatem dizendo que canibalismo gera distúrbios)? Se fosse você, leitor, você passaria a pagar para que matassem crianças, apenas para que seu paladar fosse agradado? Se a resposta é negativa, porque devemos aceitar comer um boi e não um gato, ou mesmo uma criança? Se alguém estiver disposto a cair no erro de argumentar que a criança poderá se tornar um ser inteligente no futuro e o boi não, entenda-se como uma criança que nasceu acéfala, sem cérebro, e ainda órfã, para evitar argumentos como “tem o sentimento da família”. Alguém que come carne de boi, por exemplo, mas não de outros animais, humanos ou não, não tem argumentos éticos para se defender, ou ao menos eu nunca ouvi tais argumentos. E, como último argumento, algumas pessoas dizem que, se o mundo fosse vegetariano, não teríamos espaço físico para plantar o que o mundo necessitaria para comer. Esse é um argumento deveras superficial de pessoas que não estão comprometidas em pesquisar sobre suas afirmações. São usados 2/3 da produção mundial de grãos para alimentar o gado; estima-se que a quantidade de grãos usados para alimentar um boi durante toda a sua vida daria para alimentar de duas a três pessoas durante o mesmo tempo. E, além disso, o metro quadrado de agricultura é mais rentável à economia do que o metro quadrado de agropecuária, o que torna o vegetarianismo mais benéfico ainda.
Quanto ao leite de animais não-humanos e ovos, é uma grande estupidez do ser humano ingerir essas coisas. O único leite que obviamente existe para a alimentação do ser humano é o leite materno, e mesmo assim durante os primeiros anos de nossa vida. O leite da vaca, da égua, da mula, da ovelha, etc., existem para alimentar a sua espécie respectiva, não para alimentar o ser humano. Embora eu particularmente não a dê muito crédito, existe uma teoria que diz que a média de vida dos mamíferos é calculada com base no tamanho de seu período de amamentação, afirmando que, quanto maior esse tempo, menor o tempo de vida do mamífero; se esta teoria estiver certa, os seres humanos tem um período de vida extremamente reduzido, pois, na teoria, mamam a vida inteira! Alguns argumentarão que o leite é a maior fonte de cálcio encontrada facilmente, e isso é verdade. Porém, vegetais de folhas verde-escuras tem um pouco de cálcio e também de vitamina K, que é biocompatível com o cálcio, o que proporciona uma rápida absorção do cálcio pelo organismo; portanto, é mais produtivo para o caso cálcio comer constantemente vegetais de folhas verde-escuras do que se alimentar de leite de animais não-humanos. Além do cálcio não há nada no leite que não possa ser substituído facilmente por frutas, que também fornecerão outras coisas importantes na alimentação, como vitaminas e frutas. Quanto aos ovos, são algo pior do que o leite. No organismo do ser humano não há nada que aponte a necessidade do consumo de ovos, muito menos há algo no organismo humano com função de se alimentar de ovos; até onde sei, o único animal que possui um aparelho digestivo preparado para a ingestão de ovos é a cobra. Não há nada no ovo que não possa ser encontrado em uma alimentação vegan balanceada; e, além disso, o ovo é uma alta fonte de gorduras, e a sua ingestão aumenta o nível de colesterol e triglicerídeos da pessoa, o que não é boa para a saúde, e exatamente por isso o ovo é um dos primeiros alimentos que são restritos na dieta de pessoas com problemas de coração. Dados esses argumentos, acredito ter provado que o leite de animais não-humanos e ovos não são necessários ou, menos ainda, próprios para uma dieta de um ser humano, seja ele onívoro ou vegetariano.
Quanto a usar partes de animais como vestimenta, de tão ridícula que é essa idéia, não sei como começar a argumentar, então o mais lógico será “começar do começo”. Na época denominada (erroneamente) como pré-história o homem, para fugir das intempéries climáticas, usava as peles dos animais que caçava para confeccionar vestimentas, e durante muito tempo isso foi uma necessidade, pois ainda não existiam fibras vegetais e/ou artesanato especializado para fazer vestimentas de outra forma. Mas hoje em dia as vestimentas feitas com partes de animais, geralmente sua pele, não possuem nenhum argumento que as justifique, são apenas um luxo, e um luxo prejudicial. Enquanto pessoas gastam quantias enormes de dinheiro com casacos de pele, outras morrem de frio nas ruas, sem ter um agasalho; as roupas feitas de pele são apenas uma ostentação dos ricos, que bancam desfiles milionários em nome do consumismo. Uma chinchila, por exemplo, é um animal que cabe na palma da mão de um adulto; porém, da sua pele são feitas várias peças de moda, inclusive casacos. Imaginem quantos desses animais não tiveram que ser mortos para a confecção de um único casado. Existem tecidos 100% vegetais muito mais resistentes que o couro, e por tudo de origem vegetal ser renovável e mais barato que as coisas de origem animal, não se justifica o uso do couro para nada. Existem tecidos 100% vegetais de usos e texturas os mais diversos, o que anula a necessidade do uso de produtos de origem animal em roupas e acessórios, só podendo explicar a existência desses como um luxo, o que certamente não é defensável pelas vias da ética.
Quanto a testes em animais feitos em nome da ciência e da medicina, também podem ser considerados prejudiciais à própria humanidade, e vou tentar mostrar o porque. Testes em animais não servem para comprovar efeitos em seres humanos, são feitos como segurança para disputas judiciais; se uma indústria de remédios lançar uma nova droga no mercado e ela fizer qualquer tipo de mal nas pessoas humanas, a empresa alegará inocência pois fez testes em várias espécies de animais, pois em muitos países leis obrigam empresas a testar seus produtos em animais. O organismo dos animais não-humanos é diferente do organismo do ser humano, mesmo que haja alguma semelhança, o organismo é algo vivo e interativo; por exemplo, se você pegar algum órgão de um animal não-humano que seja igual ao do ser humano e fizer testes nesse animal com base apenas nesse órgão, vai se esquecer da cadeia de outros órgãos que existem no animal e que trabalham em conjunto com aquele. Se, por exemplo, fizerem testes de remédios cardíacos em suínos pela semelhança do coração desses animais com o do ser humano, os efeitos podem variar por causa dos rins, pulmões, estômago, fígado, etc. do suíno, que podem possuir certa diferença dos respectivos órgãos no ser humano, gerando resultados totalmente diferentes dos gerados em seres humanos. Se cientistas fazem testes com animais machos e depois o repetem com animais fêmeas e extraem resultados diferentes, o que podemos dizer de se pegar um resultado de um teste feito em um rato, gato ou cachorro e aplicar a mesma lógica para o ser humano? “A maior parte das informações úteis para seres humanos é obtida em testes clínicos com seres humanos. (...) Na verdade, a utilização de animais pode até atrapalhar esse processo. O desenvolvimento da vacina contra pólio, por exemplo, atrasou dez anos porque o modelo animal não produziu os resultados esperados” – palavras de Jerry Vlasak, médico. Vale lembrar que existem teorias que afirmam que a AIDS surgiu por experimentos com animais. Existem testes que são absolutamente cruéis, sem fundamento clínico nenhum. Até hoje animais são obrigados a se viciar em cocaína, LSD, álcool e outras drogas, que são substâncias sabidamente nocivas ao organismo até por pessoas leigas no assunto. Alguns alegam que esses testes são feitos com “condições diferenciais”, para se analisar os efeitos em condições adversas, mas, o que serão essas condições? Teria a cocaína alguma diferença em ser usada no frio ou no calor? O álcool faria menos mal se a pessoa o consumisse de cabeça para baixo? Se é para saber o resultado em seres humanos, temos hoje em dia várias alternativas ao uso de animais, como testes diretamente em seres humanos, autópsias, análise de tecidos, teste em culturas de células humanas e modelos matemáticos; existe até um livro sobre o assunto, “Alternativas ao Uso de Animais Vivos na Educação Pela Ciência Responsável”, do biólogo Sérgio Greif. Eu teria mais alguns argumentos a apresentar no caso, mas se alguém não se convenceu com os apresentados acima, na minha opinião não tem um compromisso com a ética e com o bem estar do mundo de uma forma geral, então acredito que os apresentados são suficientes, e convido a todos os leitores desse texto a não acreditarem prontamente neles, procurem em outras fonte e confiram.
Quanto a “divertimentos” que usam animais e zoológicos, me sinto um tolo ao ter que dizer que essa crueldade é desnecessária. Circos que trancam animais em gaiolas minúsculas, privando-lhes da liberdade apenas para que pessoas possam ter momentos de alguma alegria. Existem circos que não usam animais em suas apresentações e mesmo assim são de excelente qualidade, como, por exemplo, o Cirque de Solei (não sei se a grafia está certa), que usa apenas seres humanos em suas apresentações, que são consideradas de altíssimo nível, sendo caras e raras suas apresentações. Quanto aos rodeios e vaquejadas, outra coisa impossível de se defender, ou pelo menos assim vejo. Para que o animal esteja agitado daquela forma nos rodeios, lhe amarrada uma cinta dos testículos, que é puxada fortemente no momento em que a prova vai começar, e é exatamente por isso que o animal fica agitado daquela forma; alguns rodeios afirmam não usar mais esse método, mas eu não sei como um animal ficaria agitado daquela forma por ter um peso tão insignificante para ele como o ser humano, logo o touro, um animal capaz de amassar um carro com uma cabeçada, e, além disso, se esse método não é usado, porque os animais de rodeio apenas são machos? E a rede Globo há pouco tempo ganhou muita audiência exibindo rodeios em uma de suas novelas, com milhares de pessoas assistindo. E quanto aos zoológicos, não existe uma razão concreta para a existência deles. Qual a vantagem de se trancafiar um animal selvagem para que pessoas possam vê-los? A humanidade não será beneficiada de forma alguma com isso, não será feita nenhuma descoberta científica com pessoas olhando para animais, apenas as pessoas verão animais longe de seu habitat natural, privados de sua liberdade e, por isso, agindo diferentemente da forma que agiriam na natureza. Ora, se é interesse das pessoas ver os animais, porque essas não se dirigem a um safári, para ver os animais onde deveriam estar? E o safári tem uma função dupla nesse caso: além de ver os animais, a pessoa verá seu habitat, que para isso deverá ser preservado, ajudando a manter o equilíbrio ambiental no mundo, prejudicado pelo crescimento desenfreado da “civilização”.
E, por fim, devo tratar aqui da minha relação, ou melhor, da minha não-relação com o divino, ou seja, devo me ocupar com a explicação da minha posição agnóstica. Muitas pessoas tem uma visão equivocada sobre o que vem a ser o agnosticismo, definindo-o como “sem opinião em relação ao divino”, “sem religião”, “que não acredita nem desacredita”, “em cima do muro”, etc. O termo agnosticismo foi criado por Thomas Henry Huxley (avô paterno do escritor Aldous Leonard Huxley, da famosa obra “Admirável Mundo Novo”, ou “Brave New World” no original), em uma reunião da Sociedade Metafísica, em 1876. Nas suas palavras, "Eles (n.a.: os membros da Sociedade Metafísica) estavam seguros de ter alcançado uma certa gnose -- tinham resolvido de forma mais ou menos bem sucedida o problema da existência, enquanto eu estava bem certo de que não tinham, e estava bastante convicto de que o problema era insolúvel." T. H. Huxley (1825-1895). Portanto, agnóstico é aquela pessoa que entende que os assuntos teológicos são infrutíferos, pois não existem provas concretas sobre a existência ou sobre a não-existência de qualquer tipo de divindade, ou ainda de qualquer coisa “sobrenatural”, ou seja, que está fora daquilo que entendemos por natural. Mas nem por isso o agnóstico deixa de possuir a sua visão sobre o divino. Existem, a grosso modo, os agnósticos deístas e os agnósticos ateus (que é o meu caso). Os agnósticos deístas não enxergam argumentos que sustentem a existência de alguma divindade, mas, pelo meio da fé (que é acreditar sem ter provas), cultuam ou louvam alguma divindade. Já os agnósticos ateus, justamente por não encontrarem argumentos e/ou razões para a crença em qualquer tipo de divindade, não veem a necessidade de se acreditar na existência de alguma, ou ainda acham que isso seria dedicar tempo e energia em algo que não terá retorno intrínseco algum.
Bom, definido o conceito de agnosticismo, o que isso tem a ver com Punk e Veganismo? Eu acredito que tudo. Todas as religiões que já conhecí, mesmo que superficialmente, até hoje falam de algum Deus, ou alguns Deuses, com inteligência, capacidade de raciocínio e senso de justiça. Muitas delas afirmam que esses Deus ou esses Deuses criaram tudo o que há no mundo, e que grande parte da, senão toda a, história da humanidade aconteceu segundo sua vontade e/ou desígnios. Uma grande parte afirma que essa divindade, ou essas divindades, agem ou já agiram diretamente em nosso mundo. Portanto, segundo esses critérios, esse Deus ou esses Deuses seriam também responsáveis por toda a disgraça que acontece no mundo; a fome, as doenças, as desigualdades sociais, os desastres naturais, etc. Então seriam esses Deuses, que possuem senso de justiça, mals. Alguns dirão que a relação com o divino não pode ser manqueísta, dividida entre e bem e mal. Mas, no meu entender, a justiça é reta e uniforme, portanto, em um julgamento, se um lado é ruim, o outro é bom. Então, se um Deus (ou mais de um) que raciocína faz crianças nascerem nas ruas, ou ao menos criou o mundo permitindo que isso acontecesse, eu considero esse Deus mau. A justiça, quando aplicada corretamente, não permite desvios e/ou meios-termos, portanto, um Deus injusto é injusto, não me interessam as justificativas que possam ser dadas. Um Deus que castiga toda a humanidade em resposta a um ato dos primeiros seres humanos seria justo? Deuses que deixaram seus seguidores serem escravizados durante séculos, muitos nascendo e morrendo escravos, são justos? Deuses que amaldiçoam aqueles que não acreditam neles são justos? Deuses que determinam, antes de nascer, quem é melhor que quem são justos? A todas essas perguntas eu responderia negativamente, não acredito que qualquer desses Deuses não podem ser considerados justos. Exatamente por isso, não acredito ser compatível a militância no movimento Punk com a crença em qualquer tipo de divindade, pois o movimento Punk estaria lutando contra aquilo que a divindade criou, e isso seria uma enorme contradição.
Quando se coloca a questão do divino em debate com o Veganismo, a coisa fica mais clara e direta. Qualquer divindade que seja que tenha criado o mundo e tudo o que existe é contrária ao Veganismo, e vou tentar explicar o porque. Pensemos na cadeia alimentar: a zebra come o mato, o leão come a zebra, o homem come o leão; simples, sem nenhuma incoerência. Acontece que a zebra lutará para proteger a sua vida quando for atacada pelo leão, mas como a zebra não é um animal caçador, sua única reação geralmente é correr. Já o leão, ao ser caçado pelo homem, tem como se defender com suas garras e seus dentes, e certamente conseguirá afastar o pequeno e franzino homem. Então o homem também tentará atacar a zebra, pois percebe que a zebra é o ponto de menor resistência, mas a zebra tem maior força que o homem, então mais uma vez o homem é frustrado em suas tentativas. O homem não tem as garras e os dentes do leão, nem a força e a velocidade da zebra, então etá em desvantagem com o resto da natureza. Mas, o homem compensa tudo isso com a sua inteligência elevada e sua capacidade de raciocínio; assim o homem inventa armas e armadilhas que facilitam a captura da zebra e até a do leão. Mas, com o tempo e o aprimoramento dessa inteligência, o homem começa a dominar todos os animais da natureza, usando-os a seu bel-prazer, não somente como forma de alimentação, ams como luxo. Casacos de pele, roupas de couro, testes em animais, exibições de circo e outros espetáculos usando animais; como justificar tudo isso? Não seria injusto ter dado ao homem uma ferramenta que lhe conferisse todo esse poder? Podem argumentar que Deus, ou Deuses, nada tem a ver com isso, e eu me intrigaria, pois algo com capacidade de criar um eco-sistema tão perfeito quanto o nosso não conseguiria prever tal coisa? E se não fosse capaz de prever, não seria capaz de consertar? Bom, mas eu volto ao ponto crucial, que é a alimentação. Como já afirmei, o homem realmente foi feito para comer carne, temos dentes caninos para provar isso. Então o Deus (ou os Deuses), que é inteligente, raciocina e é justo criou os animais com capacidade de sentir dor somente para que nós os fizessemos sentir dor? Não acredito que alguém seja capaz de defender eticamente algo assim.
Bom caro leitor ou cara leitora, esse pequeno texto tem o objetivo primeiro de esclarecer dúvidas, mostrar a visão de alguém que é punk, vegan e agnóstico. Lógico, como todos os textos que escrevo, esse me ajudou a organizar melhor minhas idéias, procurar outras fontes, consolidar argumentos e criar outros, e nesses quesitos esse texto me foi proveitoso. Espero que você, caro leitor ou cara leitora, possa ler esse texto com a cabeça “aberta”, pronto ou pronta para ouvir novas e diferentes opiniões, mesmo que após ler constate que as opiniões e idéias desse texto são as mesmas que as suas.
Sobre o autor:
Alice é menino, e este apelido se deve à personagem homônima de Lewis Carrol, do livro “Alice no país das maravilhas”, ou “Alice in Dreamland” no original. Alice é militante do movimento Punk, vegan, agnóstico, tenta tocar bateria e está aprendendo contrabaixo, professor de História, professor de um pré-vestibular comunitário, participante do Coletivo de Estudos Libertários Luiz Antônio da Costa Chaves, toca em duas bandas de Punk Rock (Melhorados e Sem Defesa), escreve o fanzine não periódico “Amor”, mantém o zine virtual P.U.T.A. (Postagens Unidas de Trabalhos Autônomos) www.flogao.com.br/zineputa e um blog de futilidades, o Complementação Humana (http://complementacaohumana.blogspot.com)
Primeiramente, queria dizer que sou um punk do Brasil, conhecí o site e gostaria de manter um intercambio de informações. Para isso estou mandando um artigo meu, que espero que possa somar ao seu acervo, mesmo que eu não saiba traduzi-lo, acho que dá para entender!
Punk, Veganismo e Agnosticismo – coisas separadas ou idéias complementares?
Por Alice
Primeiramente, me ocuparei de tentar elucidar a motivação de tal texto. Logo no título, ele já deve causar algum choque e controvérsias; como associar Punk (que é um movimento social), Veganismo (que é uma filosofia de vida) e Agnosticismo (que é uma posição sobre o conhecimento, ou o não-conhecimento, do divino)? Para mim, que sou militante do movimento Punk, Vegan e Agnóstico, essas coisas parecem se encaixar perfeitamente; mas creio que essa visão não é sequer comum, que dirá universalmente conhecida. Portanto, resolvi escrever esse texto, mostrando que o lado social, o lado ético e o lado “espiritual” de uma pessoa podem existir em harmonia, sem a necessidade de falsas afirmativas e nem de verdades absolutas. Além disso, o texto também me será útil para esclarecer a outros a minha visão sobre o movimento Punk, o Veganismo e o Agnosticismo, o que certamente me poupará tempo e esforço de responder questões que, de alguma forma, unem dois ou mesmo os três aspectos citados. Já me aconteceu de, por exemplo, estar explicando o que acredito ser o movimento Punk, daí a conversa entrar em Veganismo e eu ter de defini-lo para então surgir a necessidade de esclarecer a minha posição agnóstica.
A começar pelo aspecto social, vou tentar aqui elucidar a minha visão sobre o movimento Punk e o que me faz declarar-me militante desse movimento. O movimento Punk é, por essência e por definição, um movimento libertário, ou seja, um movimento que busca a liberdade, ou sendo mais específico, que busca a liberdade do ser humano, seja ela física, mental, de expressão, de opinião, etc. Sempre fui uma pessoa muito afeiçoada à liberdade, desde criança sempre ataquei com “por quês” qualquer coisa que me obrigassem a fazer. A mim sempre foi estranha a idéia de se fazer aquilo que não se quer, independente do resultado disso. Por volta dos 15 anos, comecei a me interessar por assuntos relacionados à política (entenda-se bem que o termo usado foi política, não politicagem), e então comecei a militar na entidade estudantil secundarista de meu município; devo toda a minha base de formação política a esse período da minha vida. Lá, como já se faz costume em entidades estudantis, havia muito envolvimento de partidos políticos, cada qual buscando a entidade apenas como um meio de conquistar as suas próprias metas, independente do objetivo da entidade; assim sendo, pude ver e perceber o quão mesquinhas eram as disputas entre tais partidos. Eu que ia às reuniões para discutir, trocar idéias, organizar passeatas, etc. apenas via discussões vazias entre membros de partidos opostos, ataques pessoais que nada traziam de produtivo à discussão e uma clara disputa pelo controle da entidade. Então, logo no começo da minha militância, aprendi que partidos políticos não são uma boa coisa; porém, dialeticamente, a pessoa que mais contribuiu na minha formação política nesse período e que mais me foi sincero foi um dos membros mais devotos de um desses partidos. Com o passar do tempo e a expansão de minhas leituras, me afastei da entidade e comecei a militar por conta própria, indo em passeatas, fazendo panfletagem e organizando discussões onde achasse conveniente, sem me associar a qualquer tipo de grupo. Foi nessa época que conheci um amigo que é militante do movimento Punk, e com a nossa convivência, fui percebendo que as minhas práticas eram muito semelhantes às dele, mas ainda assim resisti a me “proclamar” punk. Só disse a mim mesmo que eu era punk quando procurei conhecer um pouco mais a fundo o movimento e pude perceber que não só as práticas, mas também a história do Punk era totalmente condizente com aquilo que eu acreditava; então pensei “ora, se sou libertário como um punk, ouço músicas de punks, milito com punks e me identifico com a história do Punk ... não me dizer punk nessas condições seria mais uma pirraça do que evitar rotulações!”. Mas essa “declaração” que fiz para mim mesmo, e também a quem perguntasse, não trouxe mudanças significativas, pois apenas continuei fazendo tudo o que já fazia, mas agora eu fazia parte de um movimento, deveria lutar pela coerência e existência dele. Então passei a ter uma posição mais ativa quanto a estudar o Punk; peguei livros sobre o assunto diretamente (ex.: “O que é Punk”), sobre coisas relacionadas (ex.: “Discurso sobre a origem das desigualdades entre os homens”) e em livros de História em geral, também usei a Internet como fonte de consulta e leitura, mas sempre adotando a posição de encarar os textos da Internet com cautela, sabendo que qualquer coisa pode ser escrita na Internet, havendo ou não compromisso com a verdade. Assim fui elaborando e depurando a minha visão sobre o movimento Punk que foi se tornando diferente da primeira que tive, e isso foi um fato extremamente positivo. Comecei a perceber que o punk não é apenas um drogado sujo, muitas das vezes ele não é nem um, nem outro; o punk é uma pessoa que percebeu que há algo de errado na organização da sociedade, percebeu que enquanto pessoas comem de tudo o que desejam, outras morrem de fome nas ruas, que enquanto uns trabalham toda a vida e mal conseguem se sustentar, outros ostentam sem nunca haver trabalhado. Mas somente essa percepção não torna ninguém um punk, pois acredito que somente a hipocrisia e inverdades são capazes de impedir essa percepção. Além de perceber isso, o punk revolta-se contra isso e sabe que a mudança só depende dele, sabe que se não for ele e não for agora, não será ninguém e não será nunca; por isso, o punk está disposto a dedicar a sua vida a combater aquilo que considera errado, injusto, cruel, decadente e pútrido, e o punk sabe que a raiz de todos os males atuais de nossa sociedade está na forma que ela está organizada, uma sociedade hierarquizada, onde o homem é dominado pelo homem, e sabendo disso, entende que a única forma de vivermos em um mundo melhor é acabando com essa organização social baseada em hierarquias e no dinheiro e construir uma nova sociedade, baseada na liberdade e na igualdade. Portanto, todas as posturas punks são desdobramentos desse entendimento. O movimento punk é um movimento minimalista, visceral, instintivo; minimalista no sentido que cada militante sabe que seu trabalho é parte essencial para a construção de um todo, visceral no sentido de que o punk liberta por suas atitudes e comportamento tudo aquilo que o sufoca e o faz morrer um pouco a cada dia, e instintivo pois o punk acredita que aquilo pelo que ele luta é instinto da raça humana, a liberdade seria um bem essencial na vida do homem, só alienável com algum consentimento, mesmo que ludibriado, e o punk jamais consentirá com a extinção da liberdade. Se o punk não se importa com suas vestimentas, ou melhor, usa um visual agressivo, é para mostrar que a pessoa não é definida pelo que possui, mas sim pelo seu conjunto único de características físicas e mentais; se o punk se declara contra as instituições, é porque sabe que a realidade é dinâmica e que nada dura para sempre; se o punk procura a arte underground, é porque sabe que a arte parte de cada um, não do dinheiro ou de grandes corporações. Há uma questão que gera muito debate entre os punks, mas que eu gostaria de deixar patente aqui a minha opinião sobre, que é a questão das drogas. O movimento Punk começou na Inglaterra dos anos 70, uma sociedade baseada na moral e nos bons costumes acima de tudo; como o objetivo do Punk é atacar a sociedade que considera errada, as atitudes dos punks da época eram totalmente coerentes com seus objetivos. Eles usavam drogas e saiam para fazer baderna nas ruas, bebiam até cair em pubs, ficavam pulando dentro de trens para chocar as pessoas, faziam shows barulhentos em locais públicos, ocupavam praças com seu visual agressivo, xingavam senhoras recatadas e defensoras do sistema, etc; nada melhor para atacar uma sociedade baseada na moral e nos bons costumes do que não ter moral e manter maus costumes, certo? Bom, hoje em dia, porém, nossa sociedade mudou de foco: não é mais uma sociedade baseada na moral e nos bons costumes, é uma sociedade baseada na exploração e na ganância. Pois bem, sabemos que as drogas (todas elas) atendem aos interesses dos poderosos em, pelo menos, duas vias, movimentando a economia e funcionando como válvula de escape para as pessoas, que ao invés de enfrentarem o patrão por melhores salários, enchem a cara no bar. Então, nos dias de hoje, as drogas só contribuem com a lógica do sistema, fazendo-o crescer e se fortalecer. Nesse caso, se o punk é contra o sistema, terá, acredito, que ser também contra as drogas; beber nas ruas não choca mais ninguém e usar drogas não é mais sinal de rebeldia, mas sim sinal de fraqueza. Então o punk que bebe todo dia, achando que está contrariando a lógica do sistema, sendo rebelde e fazendo o que ele quer, na verdade está colaborando com o sistema, sendo manipulado e, logicamente, não sendo punk. Muitos, sem argumento algum, insistirão em dizer “eu bebo porque quero, ninguém me obriga a isso, quando bebo fico chato e o sistema não quer chatos, quer engomadinhos”; para esses, eu apenas digo que quanto mais ele bebe, mais ele ajuda a indústria do álcool a crescer, algumas empresas de bebidas alcoólicas são multinacionais, então qual seria a diferença entre o Mc’Donalds e uma empresa dessas? Bebida pode, comida não? Não creio que alguém comprometido com a mudança da sociedade e disposto a viver por isso tenha argumentos para defender o consumo de drogas; as legalizadas fortalecem o ramo industrial, explorando milhares de empregados, as ilegais fortalecem o tráfico, aumentando a violência e, por conseqüência, aumentando a repressão do estado sobre nós mesmos, membros das classes menos abastadas. Na verdade, até alguém sem nenhum comprometimento com mudança social mas que esteja certo que não deseja causar mal a outras pessoas também não terá argumentos sólidos para defender o uso de drogas. Vou dar dois exemplos clássicos e bem simples do que estou falando:
1) Imagine que você, para fazer uma festa, comprou um engradado de cerveja, que custou 20 reais. Desse dinheiro foram repassados 10 reais ao fabricante, que o usou na expansão de seu comércio, que passou a abranger o bairro X, onde nunca havia chegado bebida alcoólica. Um pai de família do bairro X foi despedido do emprego na mercearia que trabalhava e resolve encher a cara no bar a caminho de casa. Chegou em casa bêbado, espancou a mulher e estuprou a filha de sete anos, tudo isso com a ajuda do SEU dinheiro;
2) Você vai ao morro e compra 20 reais de cocaína, o vendedor usa o dinheiro para comprar uma arma, meses depois ele assalta sua mãe, ela reage, e o assaltante, nervoso, mata sua mãe com a arma que comprou com SEU dinheiro.
Muitas pessoas refutam esses exemplos com argumentações do tipo “não é minha culpa, cada um faz o que quer, eu não espanquei a mulher do cara e estuprei sua filha ou matei a mãe de ninguém”; e se você pudesse, somente conversando, convencer o cara do primeiro exemplo a não beber e ele chegasse em casa, beijasse sua mulher e contasse uma historinha para sua filha, você conversaria com ele? E se minutos antes do assaltante do segundo exemplo matar sua mãe você pudesse denunciá-lo à polícia, você o faria? Duvido que muitas pessoas possam ser sinceras ao responder essas perguntas com um “não”, mas mesmo respondendo afirmativamente seria difícil estar “no local certo, na hora certa”, então você ainda acha que não pode fazer nada, não é? Mas você pode, se a pessoa dos exemplos nunca tivesse usado drogas, nada daquilo teria acontecido. Muitos alegarão que isso pode ser um prazer, e que ninguém deve renunciar a um prazer para agradar, ou mesmo preservar, outros. Mas será que isso é realmente certo, trocar um prazer por uma sociedade melhor? E, diga-se de passagem, as drogas são um prazer autodestrutivo, então há outras opções muito melhores.
Visto tudo isso, como pode o punk usar drogas, se batalha por uma sociedade justa e igualitária? Eu acredito que a luta do punk deve se dar em todos os setores da sua vida, não dá pra ser punk nisso e não ser naquilo, ser punk é assumir um compromisso consigo mesmo, e acredito que seja uma das piores coisas do mundo mentir para si mesmo. Queria, antes de mudar de assunto, deixar claro aqui que não sou Straight Edge (para quem não conhece, é um grupo que não usa drogas e é adepto do amor fiel, sendo contra a prostituição, e eles se identificam com um “X” na mão, ou ainda colocando um “X” antes e depois de seu nome), pois quando vim a saber o que era o Straight Edge já me posicionava contra o uso de drogas. Outra coisa que eu gostaria de esclarecer sobre o movimento Punk é a confusão que existe entre Punk e Punk Rock. Muitos punks ouvem exclusivamente a combinação punk/hardcore, e na maioria das bandas punks se encontram letras de protesto e ativismo; ora, então, isso é muito positivo para o punk, pois ajuda ele a manter seu ideal de pé sempre, além de mostrar que a música também pode servir pra veicular suas idéias, não apenas divertir e entreter. Disso resulta que muitas pessoas, e até mesmo os próprios punks, pensam que o punk tem que ouvir música punk, outros chegam mais longe, afirmando que o punk deve ouvir apenas música punk. Na minha opinião, as duas coisas são inverdades. O movimento Punk nasceu após a invenção do Punk Rock, ou música punk, não o contrário, e acredito que mesmo que a música punk tivesse nascido depois do movimento, não haveria necessidade de a militância ouvir o som punk. Lógico que pertencer a um movimento significa abraçar e incorporar a sua história, mas também não significa criar determinantes, muito menos no caso de um movimento libertário, como é o caso do movimento Punk. Dizer que para uma pessoa ser punk ela tem que ouvir música punk é um absurdo; se, por exemplo, uma menina adota o visual agressivo e simplista do punk, com um belo moicano e roupas baratas, faz protestos sempre, faz panfletagem, é libertária, luta pela extinção do sistema atual e sua substituição por uma sociedade justa e igualitária e gosta apenas de música folclórica, fazendo inclusive parte de uma banda underground, o que há de incoerente se essa menina se declara punk? Eu, sinceramente, não vejo nada de incoerente ou de errado nisso, e, sob pena de estar sendo parcial, não vejo como alguém pode apontar um erro nisso. Acho que é reduzir a abrangência do movimento dizer que alguém é ou não é punk pela música que não ouve (lógico que pode-se apontar estilos musicais opostos aos ideais punks, como, por exemplo, o “funk carioca”, que prega o uso de drogas, machismo, feminismo e segregação, fechando os negros e favelados no “seu espaço”, pois não podem conviver no mesmo espaço que a elite). Também temos que prestar atenção para não cometermos o erro oposto, ou seja, abrir o conceito de punk a qualquer pessoa que tenha ideais semelhantes ao Punk. No exemplo mesmo da música, se temos um dono de uma multinacional, que só veste roupas caríssimas simplesmente pela etiqueta, que explora cada vez mais seus funcionários, é de extrema-direita, ultraconservador e adora música Punk, principalmente as bandas mais undergrounds, podemos classificar essa pessoa como Punk? Eu afirmo que não; na verdade, nem precisamos extrapolar tanto, pode ser uma pessoa comodista que gosta de música Punk, e eu não o considerarei punk. Ser punk é ser libertário, sem dogmas ou fórmulas, é atacar de frente o sistema, dizer que não o deseja, que quer é ver sua desconstrução e substituição de uma sociedade libertária, justa e igualitária, e não acho que o tipo de música que uma pessoa ouve possa arruinar-lhe a convicção que deve possuir para abraçar o Punk em sua vida.
Como tentei mostrar, o Punk é um movimento social que busca a liberdade do ser humano, pois os punks entendem que o ser humano não existe para ser aprisionado ou hierarquizado. Mas, com o tempo e convivência com pessoas do movimento ou próximas a ele, ouvi falar superficialmente do Veganismo; sabia apenas que eram pessoas que não comiam nada que tivesse componentes de origem animal, tal como carne, leite, ovos e derivados. Eu até brincava com isso, dizendo que eu nunca ia conseguir deixar de comer um X-tudo; mas a curiosidade cresce, e um colega que também brincava assim leu umas coisas na Internet sobre o Veganismo, e quando ele me falou, comecei a pensar melhor, e eu mesmo resolvi procurar sobre o assunto na Internet. Os textos que li eram daquele tipo que choca você, falando de quanto sofrem os animais que são abatidos, que a carne é um luxo, pois atualmente podemos substituí-la por proteína de soja, que proteína de soja é mais barata que carne, que a indústria da carne usa 2/3 da produção mundial de grãos, o que daria para acabar com a fome no mundo, o quanto é cruel o processo de retirar peles de animais, as maldades que são feitas com seres que sentem dor, medo e angústia em nome da ciência, etc. Fiquei impressionado, nunca havia lido, visto ou ouvido coisas semelhantes, achava que os vegetarianos que existiam no mundo eram motivados por ter uma vida saudável; foi através desses textos também que descobri que o Veganismo não se limitava apenas à alimentação, mas se fazia em nome da libertação animal. Cortei os produtos de origem animal da minha dieta logo após isso, e foi muito complicado. Quando fui à casa do meu pai e dei a notícia, ele falou que isso era errado, que o homem só tinha evoluído, pois comeu carne e que se parássemos de consumi-la iríamos regredir, e prometeu me mostrar um texto sobre isso. O texto que ele me apresentou foi uma matéria da revista superinteressante, escrito por Rodrigo Vergara; depois de ler o texto, eu sabia que nunca mais conseguiria comer carne, aquele texto deu razão e fundamentos para aquilo que eu vinha fazendo apenas pelo choque que tive pelas informações que vi, ou seja, foi através desse texto que passei a pesquisar mais e querer saber mais sobre o Veganismo, acho que se não o tivesse lido ou qualquer coisa semelhante, depois de uns três meses ia cair, não tinha o pilar ideológico necessário para manter a minha posição. Dali pra frente comecei a buscar mais fontes, e a primeira grande obra que vi sobre o tema foi do filósofo Peter Singer, o nome do livro é “Ética Prática”, é um livro excelente, pois trata de vários assuntos éticos de grande repercussão, como eutanásia, aborto, teste com células tronco embrionárias e, claro, testes em animais e se é eticamente defensável comê-los. O autor é muito conhecido no meio do Veganismo, pois foi após o lançamento dessa obra dele que surgiram as primeiras grandes entidades de combate à violência contra animais. Singer trabalha com uma gama enorme de argumentos, sempre apontando os rumos de várias correntes filosóficas e se aprofundando naquela que defende. Daí pra frente comecei a pesquisar cada vez mais, o Veganismo passou a fazer parte da minha vida, do meu cotidiano, das minhas preocupações. Hoje, vegan ha mais ou menos três anos, já tenho meus conceitos definidos (o que não significa estáticos ou imutáveis) sobre o Veganismo, não estou mais caminhando no escuro como no primeiro ano; foi, com certeza, uma escolha difícil, significou abandonar 17 anos de “cultura onívora”, sem me preocupar com os animais, mas como fiz convicto que o Veganismo é uma necessidade, não uma opção, nunca dei nenhum passo para trás e, sem falsa modéstia, me orgulho muito disso. Cada um tem o seu tempo e o seu ritmo, e eu conheço pessoas que demoraram mais para atingir o Veganismo, outras menos, mas eu nunca “caí” (gíria que usamos quando algum vegan come algo de origem animal, usa vestimenta de lã, couro, etc., usa produtos testados em animais, vai a espetáculos que usam animais, etc.) conscientemente, pois, claro, na nossa sociedade todo vegan ha algum tempo já caiu com coisas pequenas (corantes, produtos químicos, materiais que pensavam ser sintéticos, etc.); eu conheço vegans que já pararam durante um tempo, outros que foram vegans e hoje não são mais, pessoas que tentam, ovo-lactos, etc., cada um na sua.
Bom, mas o que é realmente o Veganismo? Vou tentar definir o que acredito ser o Veganismo, embora acredite que, no caso específico do Veganismo, não existam muitas divergências conceituais. Vegan ou vegano é aquela pessoa que adota a libertação animal como filosofia de vida; as motivações dos Vegans podem ser várias, mas a minha em particular, e a mais difundida pelo que sei, é a “igual consideração de interesses”. É sabido pela ciência que animais são capazes de sentir dor, tanto física quanto psicológica, na forma de medo e angústia; se animais podem sentir dor e não temos a necessidade de causá-la, por que continuar? Sadismo? O Veganismo, diferente do Punk, é uma filosofia de vida, não um movimento; além disso, gostaria de esclarecer que o Veganismo é uma escolha ética, portanto não se pode envolver coisas que não digam respeito única e exclusivamente à ética, como religião, sentimentos, etc. Existem vários tipos de vegetarianismos, o Veganismo é um deles, e vou tentar definir cada um aqui: Vegetariano (pessoa que não come carne, ovos, leite nem derivados, sua alimentação é exclusivamente vegetal); Ovo Vegetariano (pessoa que se alimenta de vegetais, ovos de animais e derivados); Lacto Vegetariano (pessoa que se alimenta de vegetais, leite animal e derivados); Ovo-Lacto Vegetariano (pessoa que se alimente de vegetais, leite animal e derivados, ovos animais e derivados); Frugívoro (pessoa que se alimenta exclusivamente de frutas); Crugívoro (pessoa que se alimenta exclusivamente de alimentos crus); Vegan (pessoa que adota a causa da libertação animal, não usa produtos testados em animais, peles, pelos e similares em vestimenta, não se alimenta de nada que contenha produtos de origem animal, boicota espetáculos com animais, enfim, abole tudo que explorar e fizer sofrer os animais). Normalmente, só o vegan tem, entre essas sete classificações, um motivo diferente de saúde para fazer a opção. Muitas pessoas rebatem com argumentos falsos as questões levantadas por vegans sobre a necessidade ou não do uso de animais na alimentação, vestuário e testes científicos; vou tentar agora mostrar os argumentos dos vegans, a forma mais comum como são rebatidos e porque essas respostas são inverídicas.
A primeira alegação que fazem é de que é impossível ao ser humano extrair dos vegetais as proteínas necessárias ao funcionamento do corpo humano, que só na carne animal isso é conseguido eficientemente, visto o tamanho diminuto de nosso estômago. Sem sombras de dúvidas o ser humano foi feito para comer carne, e nem preciso ir longe para afirmar isso, basta que observemos a boca do ser humano: temos 32 dentes, entre os quais são 8 incisivos, que servem para cortar (adequados para vegetais); 4 são caninos, que servem para rasgar (adequados para carne); e 20 são molares e pré-molares, que servem para esmagar e triturar (adequados para grãos). Portanto, a dieta ideal para o ser humano seria constituída de 2/8 de vegetais, 5/8 de grãos e 1/8 de carne! Isso já mostra que a carne não deveria ser tão consumida quanto o é em nossa sociedade. O corpo humano não necessita de “vegetais”, “grãos” ou “carne”, mas sim de “fibras”, “ferro” e “proteínas”, por exemplo; portanto, se substituirmos nossa alimentação por qualquer coisa que contenha os elementos que necessitamos, não há problemas. Também não posso discutir que a carne é a maior fonte de proteínas e que não podemos extrair as proteínas necessárias para nossa vida comendo vegetais, para isso uma simples comparação de nosso estômago e intestinos com os mesmo órgãos de animais herbívoros, percebe-se que nosso estômago é pequeno (para digerir pouca quantidade) e nossos intestinos grandes (para extrair os nutrientes e destruir o resto da comida), já os herbívoros possuem estômago grande (pois tem que comer muito) e intestino pequeno (como a comida é “leve”, o estômago faz o trabalho quase todo). A carne é quase 70% proteína, contra os menos de 20% de proteína contidos na soja, então teríamos que comer 3,5 vezes mais soja do que carne para viver. Porém, com a nossa moderna tecnologia, tira-se tudo da soja que não for a proteína (principalmente seu óleo, que é muito comercializado), e tem-se um alimento com quase 100% de proteína, conhecido como “Proteína de soja texturizada” ou “carne de soja”; uma pessoa que come carne tem que comer 1,5 vezes mais carne do que quem come proteína de soja. Vale ressaltar que a proteína de soja é mais barata que a carne, sendo assim, come-se carne por qualquer outro motivo, menos por necessidade. Na verdade, o consumo de carne é um fator cultural em nossa sociedade, não tem nada a ver com o fato de agradar ou não o paladar; para ficar mais claro, vou exemplificar. Uma pessoa que adora carne é chamada por um colega para experimentar um prato novo em sua casa, e vai. Durante a refeição, come bastante, pois o paladar lhe agrada, e, ao término, quando questionado, aprova e pergunta do que se trata, daí lhe respondem que era carne de um animal exótico, como por exemplo, pavão; certamente essa pessoa, sempre que puder, irá comer carne de pavão, pois lhe agradou o paladar. Mas se lhe informassem que, ao invés de carne de pavão fosse carne de cachorro, ou gato, ou cavalo, ou qualquer outra espécie de animal que em sua cultura não se come; certamente essa pessoa ficaria chocada e, mesmo tendo outras oportunidades, não comeria mais dessa carne. Ou, indo mais longe, se lhe dissessem que era carne de um recém nascido, tratada em laboratório para não causar mal algum (coloco nesses termos pois alguns rebatem dizendo que canibalismo gera distúrbios)? Se fosse você, leitor, você passaria a pagar para que matassem crianças, apenas para que seu paladar fosse agradado? Se a resposta é negativa, porque devemos aceitar comer um boi e não um gato, ou mesmo uma criança? Se alguém estiver disposto a cair no erro de argumentar que a criança poderá se tornar um ser inteligente no futuro e o boi não, entenda-se como uma criança que nasceu acéfala, sem cérebro, e ainda órfã, para evitar argumentos como “tem o sentimento da família”. Alguém que come carne de boi, por exemplo, mas não de outros animais, humanos ou não, não tem argumentos éticos para se defender, ou ao menos eu nunca ouvi tais argumentos. E, como último argumento, algumas pessoas dizem que, se o mundo fosse vegetariano, não teríamos espaço físico para plantar o que o mundo necessitaria para comer. Esse é um argumento deveras superficial de pessoas que não estão comprometidas em pesquisar sobre suas afirmações. São usados 2/3 da produção mundial de grãos para alimentar o gado; estima-se que a quantidade de grãos usados para alimentar um boi durante toda a sua vida daria para alimentar de duas a três pessoas durante o mesmo tempo. E, além disso, o metro quadrado de agricultura é mais rentável à economia do que o metro quadrado de agropecuária, o que torna o vegetarianismo mais benéfico ainda.
Quanto ao leite de animais não-humanos e ovos, é uma grande estupidez do ser humano ingerir essas coisas. O único leite que obviamente existe para a alimentação do ser humano é o leite materno, e mesmo assim durante os primeiros anos de nossa vida. O leite da vaca, da égua, da mula, da ovelha, etc., existem para alimentar a sua espécie respectiva, não para alimentar o ser humano. Embora eu particularmente não a dê muito crédito, existe uma teoria que diz que a média de vida dos mamíferos é calculada com base no tamanho de seu período de amamentação, afirmando que, quanto maior esse tempo, menor o tempo de vida do mamífero; se esta teoria estiver certa, os seres humanos tem um período de vida extremamente reduzido, pois, na teoria, mamam a vida inteira! Alguns argumentarão que o leite é a maior fonte de cálcio encontrada facilmente, e isso é verdade. Porém, vegetais de folhas verde-escuras tem um pouco de cálcio e também de vitamina K, que é biocompatível com o cálcio, o que proporciona uma rápida absorção do cálcio pelo organismo; portanto, é mais produtivo para o caso cálcio comer constantemente vegetais de folhas verde-escuras do que se alimentar de leite de animais não-humanos. Além do cálcio não há nada no leite que não possa ser substituído facilmente por frutas, que também fornecerão outras coisas importantes na alimentação, como vitaminas e frutas. Quanto aos ovos, são algo pior do que o leite. No organismo do ser humano não há nada que aponte a necessidade do consumo de ovos, muito menos há algo no organismo humano com função de se alimentar de ovos; até onde sei, o único animal que possui um aparelho digestivo preparado para a ingestão de ovos é a cobra. Não há nada no ovo que não possa ser encontrado em uma alimentação vegan balanceada; e, além disso, o ovo é uma alta fonte de gorduras, e a sua ingestão aumenta o nível de colesterol e triglicerídeos da pessoa, o que não é boa para a saúde, e exatamente por isso o ovo é um dos primeiros alimentos que são restritos na dieta de pessoas com problemas de coração. Dados esses argumentos, acredito ter provado que o leite de animais não-humanos e ovos não são necessários ou, menos ainda, próprios para uma dieta de um ser humano, seja ele onívoro ou vegetariano.
Quanto a usar partes de animais como vestimenta, de tão ridícula que é essa idéia, não sei como começar a argumentar, então o mais lógico será “começar do começo”. Na época denominada (erroneamente) como pré-história o homem, para fugir das intempéries climáticas, usava as peles dos animais que caçava para confeccionar vestimentas, e durante muito tempo isso foi uma necessidade, pois ainda não existiam fibras vegetais e/ou artesanato especializado para fazer vestimentas de outra forma. Mas hoje em dia as vestimentas feitas com partes de animais, geralmente sua pele, não possuem nenhum argumento que as justifique, são apenas um luxo, e um luxo prejudicial. Enquanto pessoas gastam quantias enormes de dinheiro com casacos de pele, outras morrem de frio nas ruas, sem ter um agasalho; as roupas feitas de pele são apenas uma ostentação dos ricos, que bancam desfiles milionários em nome do consumismo. Uma chinchila, por exemplo, é um animal que cabe na palma da mão de um adulto; porém, da sua pele são feitas várias peças de moda, inclusive casacos. Imaginem quantos desses animais não tiveram que ser mortos para a confecção de um único casado. Existem tecidos 100% vegetais muito mais resistentes que o couro, e por tudo de origem vegetal ser renovável e mais barato que as coisas de origem animal, não se justifica o uso do couro para nada. Existem tecidos 100% vegetais de usos e texturas os mais diversos, o que anula a necessidade do uso de produtos de origem animal em roupas e acessórios, só podendo explicar a existência desses como um luxo, o que certamente não é defensável pelas vias da ética.
Quanto a testes em animais feitos em nome da ciência e da medicina, também podem ser considerados prejudiciais à própria humanidade, e vou tentar mostrar o porque. Testes em animais não servem para comprovar efeitos em seres humanos, são feitos como segurança para disputas judiciais; se uma indústria de remédios lançar uma nova droga no mercado e ela fizer qualquer tipo de mal nas pessoas humanas, a empresa alegará inocência pois fez testes em várias espécies de animais, pois em muitos países leis obrigam empresas a testar seus produtos em animais. O organismo dos animais não-humanos é diferente do organismo do ser humano, mesmo que haja alguma semelhança, o organismo é algo vivo e interativo; por exemplo, se você pegar algum órgão de um animal não-humano que seja igual ao do ser humano e fizer testes nesse animal com base apenas nesse órgão, vai se esquecer da cadeia de outros órgãos que existem no animal e que trabalham em conjunto com aquele. Se, por exemplo, fizerem testes de remédios cardíacos em suínos pela semelhança do coração desses animais com o do ser humano, os efeitos podem variar por causa dos rins, pulmões, estômago, fígado, etc. do suíno, que podem possuir certa diferença dos respectivos órgãos no ser humano, gerando resultados totalmente diferentes dos gerados em seres humanos. Se cientistas fazem testes com animais machos e depois o repetem com animais fêmeas e extraem resultados diferentes, o que podemos dizer de se pegar um resultado de um teste feito em um rato, gato ou cachorro e aplicar a mesma lógica para o ser humano? “A maior parte das informações úteis para seres humanos é obtida em testes clínicos com seres humanos. (...) Na verdade, a utilização de animais pode até atrapalhar esse processo. O desenvolvimento da vacina contra pólio, por exemplo, atrasou dez anos porque o modelo animal não produziu os resultados esperados” – palavras de Jerry Vlasak, médico. Vale lembrar que existem teorias que afirmam que a AIDS surgiu por experimentos com animais. Existem testes que são absolutamente cruéis, sem fundamento clínico nenhum. Até hoje animais são obrigados a se viciar em cocaína, LSD, álcool e outras drogas, que são substâncias sabidamente nocivas ao organismo até por pessoas leigas no assunto. Alguns alegam que esses testes são feitos com “condições diferenciais”, para se analisar os efeitos em condições adversas, mas, o que serão essas condições? Teria a cocaína alguma diferença em ser usada no frio ou no calor? O álcool faria menos mal se a pessoa o consumisse de cabeça para baixo? Se é para saber o resultado em seres humanos, temos hoje em dia várias alternativas ao uso de animais, como testes diretamente em seres humanos, autópsias, análise de tecidos, teste em culturas de células humanas e modelos matemáticos; existe até um livro sobre o assunto, “Alternativas ao Uso de Animais Vivos na Educação Pela Ciência Responsável”, do biólogo Sérgio Greif. Eu teria mais alguns argumentos a apresentar no caso, mas se alguém não se convenceu com os apresentados acima, na minha opinião não tem um compromisso com a ética e com o bem estar do mundo de uma forma geral, então acredito que os apresentados são suficientes, e convido a todos os leitores desse texto a não acreditarem prontamente neles, procurem em outras fonte e confiram.
Quanto a “divertimentos” que usam animais e zoológicos, me sinto um tolo ao ter que dizer que essa crueldade é desnecessária. Circos que trancam animais em gaiolas minúsculas, privando-lhes da liberdade apenas para que pessoas possam ter momentos de alguma alegria. Existem circos que não usam animais em suas apresentações e mesmo assim são de excelente qualidade, como, por exemplo, o Cirque de Solei (não sei se a grafia está certa), que usa apenas seres humanos em suas apresentações, que são consideradas de altíssimo nível, sendo caras e raras suas apresentações. Quanto aos rodeios e vaquejadas, outra coisa impossível de se defender, ou pelo menos assim vejo. Para que o animal esteja agitado daquela forma nos rodeios, lhe amarrada uma cinta dos testículos, que é puxada fortemente no momento em que a prova vai começar, e é exatamente por isso que o animal fica agitado daquela forma; alguns rodeios afirmam não usar mais esse método, mas eu não sei como um animal ficaria agitado daquela forma por ter um peso tão insignificante para ele como o ser humano, logo o touro, um animal capaz de amassar um carro com uma cabeçada, e, além disso, se esse método não é usado, porque os animais de rodeio apenas são machos? E a rede Globo há pouco tempo ganhou muita audiência exibindo rodeios em uma de suas novelas, com milhares de pessoas assistindo. E quanto aos zoológicos, não existe uma razão concreta para a existência deles. Qual a vantagem de se trancafiar um animal selvagem para que pessoas possam vê-los? A humanidade não será beneficiada de forma alguma com isso, não será feita nenhuma descoberta científica com pessoas olhando para animais, apenas as pessoas verão animais longe de seu habitat natural, privados de sua liberdade e, por isso, agindo diferentemente da forma que agiriam na natureza. Ora, se é interesse das pessoas ver os animais, porque essas não se dirigem a um safári, para ver os animais onde deveriam estar? E o safári tem uma função dupla nesse caso: além de ver os animais, a pessoa verá seu habitat, que para isso deverá ser preservado, ajudando a manter o equilíbrio ambiental no mundo, prejudicado pelo crescimento desenfreado da “civilização”.
E, por fim, devo tratar aqui da minha relação, ou melhor, da minha não-relação com o divino, ou seja, devo me ocupar com a explicação da minha posição agnóstica. Muitas pessoas tem uma visão equivocada sobre o que vem a ser o agnosticismo, definindo-o como “sem opinião em relação ao divino”, “sem religião”, “que não acredita nem desacredita”, “em cima do muro”, etc. O termo agnosticismo foi criado por Thomas Henry Huxley (avô paterno do escritor Aldous Leonard Huxley, da famosa obra “Admirável Mundo Novo”, ou “Brave New World” no original), em uma reunião da Sociedade Metafísica, em 1876. Nas suas palavras, "Eles (n.a.: os membros da Sociedade Metafísica) estavam seguros de ter alcançado uma certa gnose -- tinham resolvido de forma mais ou menos bem sucedida o problema da existência, enquanto eu estava bem certo de que não tinham, e estava bastante convicto de que o problema era insolúvel." T. H. Huxley (1825-1895). Portanto, agnóstico é aquela pessoa que entende que os assuntos teológicos são infrutíferos, pois não existem provas concretas sobre a existência ou sobre a não-existência de qualquer tipo de divindade, ou ainda de qualquer coisa “sobrenatural”, ou seja, que está fora daquilo que entendemos por natural. Mas nem por isso o agnóstico deixa de possuir a sua visão sobre o divino. Existem, a grosso modo, os agnósticos deístas e os agnósticos ateus (que é o meu caso). Os agnósticos deístas não enxergam argumentos que sustentem a existência de alguma divindade, mas, pelo meio da fé (que é acreditar sem ter provas), cultuam ou louvam alguma divindade. Já os agnósticos ateus, justamente por não encontrarem argumentos e/ou razões para a crença em qualquer tipo de divindade, não veem a necessidade de se acreditar na existência de alguma, ou ainda acham que isso seria dedicar tempo e energia em algo que não terá retorno intrínseco algum.
Bom, definido o conceito de agnosticismo, o que isso tem a ver com Punk e Veganismo? Eu acredito que tudo. Todas as religiões que já conhecí, mesmo que superficialmente, até hoje falam de algum Deus, ou alguns Deuses, com inteligência, capacidade de raciocínio e senso de justiça. Muitas delas afirmam que esses Deus ou esses Deuses criaram tudo o que há no mundo, e que grande parte da, senão toda a, história da humanidade aconteceu segundo sua vontade e/ou desígnios. Uma grande parte afirma que essa divindade, ou essas divindades, agem ou já agiram diretamente em nosso mundo. Portanto, segundo esses critérios, esse Deus ou esses Deuses seriam também responsáveis por toda a disgraça que acontece no mundo; a fome, as doenças, as desigualdades sociais, os desastres naturais, etc. Então seriam esses Deuses, que possuem senso de justiça, mals. Alguns dirão que a relação com o divino não pode ser manqueísta, dividida entre e bem e mal. Mas, no meu entender, a justiça é reta e uniforme, portanto, em um julgamento, se um lado é ruim, o outro é bom. Então, se um Deus (ou mais de um) que raciocína faz crianças nascerem nas ruas, ou ao menos criou o mundo permitindo que isso acontecesse, eu considero esse Deus mau. A justiça, quando aplicada corretamente, não permite desvios e/ou meios-termos, portanto, um Deus injusto é injusto, não me interessam as justificativas que possam ser dadas. Um Deus que castiga toda a humanidade em resposta a um ato dos primeiros seres humanos seria justo? Deuses que deixaram seus seguidores serem escravizados durante séculos, muitos nascendo e morrendo escravos, são justos? Deuses que amaldiçoam aqueles que não acreditam neles são justos? Deuses que determinam, antes de nascer, quem é melhor que quem são justos? A todas essas perguntas eu responderia negativamente, não acredito que qualquer desses Deuses não podem ser considerados justos. Exatamente por isso, não acredito ser compatível a militância no movimento Punk com a crença em qualquer tipo de divindade, pois o movimento Punk estaria lutando contra aquilo que a divindade criou, e isso seria uma enorme contradição.
Quando se coloca a questão do divino em debate com o Veganismo, a coisa fica mais clara e direta. Qualquer divindade que seja que tenha criado o mundo e tudo o que existe é contrária ao Veganismo, e vou tentar explicar o porque. Pensemos na cadeia alimentar: a zebra come o mato, o leão come a zebra, o homem come o leão; simples, sem nenhuma incoerência. Acontece que a zebra lutará para proteger a sua vida quando for atacada pelo leão, mas como a zebra não é um animal caçador, sua única reação geralmente é correr. Já o leão, ao ser caçado pelo homem, tem como se defender com suas garras e seus dentes, e certamente conseguirá afastar o pequeno e franzino homem. Então o homem também tentará atacar a zebra, pois percebe que a zebra é o ponto de menor resistência, mas a zebra tem maior força que o homem, então mais uma vez o homem é frustrado em suas tentativas. O homem não tem as garras e os dentes do leão, nem a força e a velocidade da zebra, então etá em desvantagem com o resto da natureza. Mas, o homem compensa tudo isso com a sua inteligência elevada e sua capacidade de raciocínio; assim o homem inventa armas e armadilhas que facilitam a captura da zebra e até a do leão. Mas, com o tempo e o aprimoramento dessa inteligência, o homem começa a dominar todos os animais da natureza, usando-os a seu bel-prazer, não somente como forma de alimentação, ams como luxo. Casacos de pele, roupas de couro, testes em animais, exibições de circo e outros espetáculos usando animais; como justificar tudo isso? Não seria injusto ter dado ao homem uma ferramenta que lhe conferisse todo esse poder? Podem argumentar que Deus, ou Deuses, nada tem a ver com isso, e eu me intrigaria, pois algo com capacidade de criar um eco-sistema tão perfeito quanto o nosso não conseguiria prever tal coisa? E se não fosse capaz de prever, não seria capaz de consertar? Bom, mas eu volto ao ponto crucial, que é a alimentação. Como já afirmei, o homem realmente foi feito para comer carne, temos dentes caninos para provar isso. Então o Deus (ou os Deuses), que é inteligente, raciocina e é justo criou os animais com capacidade de sentir dor somente para que nós os fizessemos sentir dor? Não acredito que alguém seja capaz de defender eticamente algo assim.
Bom caro leitor ou cara leitora, esse pequeno texto tem o objetivo primeiro de esclarecer dúvidas, mostrar a visão de alguém que é punk, vegan e agnóstico. Lógico, como todos os textos que escrevo, esse me ajudou a organizar melhor minhas idéias, procurar outras fontes, consolidar argumentos e criar outros, e nesses quesitos esse texto me foi proveitoso. Espero que você, caro leitor ou cara leitora, possa ler esse texto com a cabeça “aberta”, pronto ou pronta para ouvir novas e diferentes opiniões, mesmo que após ler constate que as opiniões e idéias desse texto são as mesmas que as suas.
Sobre o autor:
Alice é menino, e este apelido se deve à personagem homônima de Lewis Carrol, do livro “Alice no país das maravilhas”, ou “Alice in Dreamland” no original. Alice é militante do movimento Punk, vegan, agnóstico, tenta tocar bateria e está aprendendo contrabaixo, professor de História, professor de um pré-vestibular comunitário, participante do Coletivo de Estudos Libertários Luiz Antônio da Costa Chaves, toca em duas bandas de Punk Rock (Melhorados e Sem Defesa), escreve o fanzine não periódico “Amor”, mantém o zine virtual P.U.T.A. (Postagens Unidas de Trabalhos Autônomos) www.flogao.com.br/zineputa e um blog de futilidades, o Complementação Humana (http://complementacaohumana.blogspot.com)
Estaria bueno que este traducido
ResponderEliminarno entendi un culo
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